quinta-feira, 1 de abril de 2021

Traga o Divino que você gostaria de ver no mundo!

De acordo com a tradição, foi no sétimo dia de Pessach, 21 de nissan, que o povo hebreu cruzou o Mar de Juncos e abandonou a terra das águas estreitas (Mitsrayim) para encontrar a liberdade na imensidão do deserto. Neste ano, 21 de nissan cai no shabat, quando o trecho da Torá tradicionalmente incluirá Shirat haYam, o poema que os hebreus cantaram ao cruzar o mar [1].

Não é difícil imaginar a angústia pela qual passavam aqueles hebreus antes da abertura do mar: de um lado, as tropas egípcias chegando; de outro, o mar à sua frente. Se ficassem, seriam mortos pelos soldados que os perseguiam; se seguissem, morreriam afogados. Finalmente, Moshé levantou seu cajado e o segurou sobre as águas do mar e Deus fez com que ele se abrisse, permitindo que o povo hebreu fizesse a travessia em segurança.

Ao analisar esta passagem, um antigo midrash diz que no Mar de Juncos, Deus apareceu ao povo como uma pessoa jovem e no Monte Sinai Deus lhes apareceu como uma pessoa idosa.[2] O mestre chassídico Levi Itschac de Berditchev, explica que esta ideia de que Deus era jovem quando abriu o mar se refere ao fato de que Deus subverteu as leis da natureza para abrir o mar, da mesma forma que jovens não prestam especial atenção às regras. A abertura do Mar, no entanto, foi uma exceção -- Deus costuma agir dentro das regras naturais, como o próprio Levi Itschac comenta a respeito das comemorações de Chanucá e Purim.[3]

Muitas vezes, ainda esperamos do Divino o nível de intervenção direta que vimos na narrativa de Pessach, comandando os eventos da história, prestando atenção aos clamores do povo, estabelecendo a justiça onde ela estava em falta. Nossa experiência histórica, no entanto, aponta em outra direção, na qual Deus espera que a humanidade aja, escutando os clamores dos vulneráveis, corrigindo suas injustiças (especialmente as sistêmicas), cuidando da Terra e de todos que nela vivem. O Deus jovem da abertura do mar deu lugar à “voz mansa e delicada” [4] e dependemos da fagulha divina em cada um para observarmos a ação Divina no mundo.

Não foram raros os momentos do nosso passado recente em que esperamos, passivos, a intervenção divina, mas parece que não vivemos na época do Deus jovem que subvertia as leis da natureza e hoje é nossa ação que se faz necessária. Em seu discurso na Marcha em Washington em 1963, imediatamente antes de Martin Luther King proferir seu famoso discurso “Eu tenho um sonho”, o rabino Joachim Prinz disse que, baseado em sua experiência vivendo na Alemanha Nazista, “o mais urgente, o mais vergonhoso, o mais vergonhoso e o mais trágico problema é o silêncio.”

Deus se manifesta de forma distinta em cada momento -- que este Shvií shel Pessach (o sétimo dia de Pessach) no qual voltamos a cruzar o mar dos juncos, nos inspire novamente e nos encorage a agir para um mundo em que todos possam chegar à sua amplidão e liberdade.

Shabat Shalom


[1] Ex. 15:1-18

[2]  Pessicta Rabati 21:5

[3] https://www.huffpost.com/entry/divine-light-human-hands-_b_793011

[4] 1 Reis 19:12


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