terça-feira, 30 de março de 2021

Podcast 5.8 - Episódio 15: Com o olhar para o futuro: o impacto da Diáspora sobre a identidade judaica em Israel

(originalmente publicado em http://5ponto8.fireside.fm/15)

"Israel não é mais para todos os seus cidadãos." Este é o título de um dos textos do nosso convidado de hoje. Com pontos de vista diversos, até polêmicos, continuaremos explorando o papel de Israel na resiliência judaica dentro e fora da Diáspora, sobre Democracia, Direito, Cultura e muito mais.

Nosso convidado de hoje é Marcos Gorinstein, formado em Ciências Sociais pela UFRJ e mestrando em Estudos Latinoamericanos pela Universidade Hebraica de Jerusalém. Marcos se mudou para Israel há 11 anos e desenvolve um projeto que ensina jiu-jitsu para crianças judias e árabes, Além disso, ele é produtos e apresentador dos podcasts Nos Anais da Mediná e Do Lado Esquerdo do Muro.

Referências:

Dicas Culturais:

Com Rogério Cukierman e Laura Trachtenberg Hauser.
Créditos da Música de Abertura: Lechá Dodi, da liturgia tradicional de Shabat | Melodia: Craig Taubman | Clarinete: Alexandre F. Travassos | Piano: Tânia F. Travassos.
Edição: Misa Obara

sexta-feira, 19 de março de 2021

Dvar Torá: Mudanças que vão além da superfície (CIP)


Pessach está chegando em 8 dias. O primeiro sêder será na noite de 27/03 e eu quero convidar todo mundo a participar deste evento comunitário garantindo toda a segurança, mantendo-se nos seus núcleos familiares limitados e integrando a comunidade através da transmissão do sêder da CIP com a condução do rabino Michel com o Alê Edelstein.

Uma das tradições na preparação de Pêssach é fazer a limpeza da casa e eu tenho estado envolvido neste processo há algum tempo. Em uma caixa perdida que eu não tinha aberto deste que me mudei para São Paulo há mais de dois anos, encontrei um monte de receitas médicas. Lá no meio, as receitas do óculos que eu devia usar mas nunca uso… Eu comecei a usar óculos logo depois de me formar na faculdade. Depois de me formar na GV de São Paulo, meu primeiro emprego foi no Banco Bozano, Simonsen, no Rio. A mudança de cidade, a construção de um novo circulo de amigos oferecia a possibilidade de me re-inventar, de sair do casulo tímido em que eu tinha vivido até então sem ter que me preocupar com as expectativas que as pessoas que já me conheciam tinham a meu respeito. Pra ajudar, vieram o óculos, novo apetrecho que possibilitaria que o tímido Clark Kent virasse o destemido Superhomem. 

Tolo engano… alguns meses vivendo no Rio, uma grande amiga que eu tinha conhecido lá descreveu como ela me via. Era um retrato idêntico ao que meus amigos de São Paulo teriam descrito, com exceção do óculos que eu tinha adicionado ao visual.

Mudanças de contexto oferecem a possibilidade de transformarmos aquilo que nos incomoda na realidade que estamos vivendo — mas elas não tem nenhum poder mágico. Se quisermos realmente transformar como interagimos com o mundo e os resultados que obtemos, não há substituto para o duro de análise das nossas ações e mudanças de condutas.

Essa é uma semana cheia de mudanças. Já na segunda-feira entraram em vigor no Estado de São Paulo as novas regras para o estado de emergência em que nos encontramos de acordo com as quais templos religiosos não são mais considerados atividades essenciais e nós aqui na CIP corremos para repensar as cerimônias todas e fazê-las cada um da sua casa. Nesta semana, mudou o ministro da Saúde. Nesta semana, começamos um novo livro da Torá.

Vaicrá ou Levítico, o livro que começamos esta semana, coloca a ênfase no trabalho ritual dos sacerdotes e nos detalhes intricados dos sacrifícios, a forma de relacionamento com o Divino naquela época. Para um leitor contemporâneo, ler estas passagens traz uma certa medida de choque, especialmente para quem acredita que o judaísmo que praticamos hoje é exatamente o mesmo que nossos antepassados praticavam na época da Torá. O mundo mudou, as sociedades mudaram e o judaísmo mudou junto. 

Os rabinos tiveram a coragem de examinar as práticas descritas na Torá de forma crítica e propuseram novas formas de relacionamento com o Divino. A reza que praticamos hoje é resultado deste processo de transformação profunda. Em um diálogo imaginado pelos Rabinos de um midrash [1], Deus teria lhes dito que precisava apenas de palavras e que elas tinham a vantagem de que podiam ser ditas nas sinagogas, nas cidades, nos campos, até mesmo nas camas ou nos corações das pessoas. Não foi uma mudança fácil, muitas pessoas disseram que isso era um absurdo, que a vontade de Deus estava claramente refletida nas práticas descritas na Torá, que a mudança era ofensiva e inconcebível. Confrontadas com o esforço de mudar, esses grupos resolveram continuar apegados ao passado. Hoje, os conhecemos pelas páginas dos livros mas eles deixaram de fazer parte do presente judaico.

Nas páginas de Vaicrá, vamos buscar valores e inspiração para nossas práticas cotidianas. Ao evitarmos uma leitura que determinasse que as práticas prescritas no texto devem determinar nosso comportamento de forma literal, garantimos que a Torá, corpo central da nossa tradição, mantenha-se relevante ainda que tudo ao nosso redor tenha se transformado. Na parashá desta semana, por exemplo, lidamos com os erros que cometemos com ou sem intenção, em particular quando as pessoas que cometem estes erros ocupam posição de liderança e inspiram outros a seguir pelo mesmo caminho. Ainda que a prática de sacrifícios e libações não façam mais parte do nosso arsenal de respostas a estes erros, esta conversa inspirada pela Torá nos leva a considerar como podemos responder a esta situações quando elas acontecem na nossa própria época.

Uma frase famosa, constantemente atribuída a Albert Einstein define insanidade como fazer a mesma coisa muitas vezes e esperar resultados diferentes. Vivemos hoje uma crise sanitária sem precedentes na história recente. O número diários de mortos pela Covid se aproxima de 3,000. Como bem lembrou o querido Theo Hotz, ex-moré da CIP e no caminho de se tornar um colega rabino em alguns anos, “Em 2001, no ataque às torres gêmeas do World Trade Center, 2977 pessoas foram vítimas do terrorismo. No Brasil, temos um 11 de setembro por dia por causa de uma única doença.” [2] Aproveitando as palavras atribuídas a Einstein, é insano acreditarmos que podemos continuar fazendo as mesmas coisas e esperarmos resultados diferentes. A situação exige a mobilização de todos nós.

É fácil colocar a culpa nos outros — apontar para políticos que pregam o contrário do que diz a ciência ou se sujeitam a pressão de grupos organizados, andar pela rua e culpar quem ainda anda pela cidade com a máscara no queijo, como se ela fosse um amuleto que pudesse salvar vidas por proximidade. E, ainda assim, continuar com suas vidas e visitar alguns poucos amigos para um choppinho no final de semana; planejar o seder de Pessach com a família porque todos estão se cuidando; pedir comida pelo aplicativo todo dia, porque o entregador precisa trabalhar também, não é mesmo?!

O salvar-vidas só vai acontecer quando cada um de nós mudar nosso comportamento pra valer — abrir mão de práticas que nos são caras e entender que a mudança cosmética pode causar impacto mas não muda nada de verdade.

Quando a gente começou a fazer os serviços remotos, falaram muito de como falar para a sinagoga vazia era diferente, gerava incômodo. Eu confesso que este novo formato com cada um em sua casa gera um incômodo muito maior — mas nada comparado à possibilidade de salvarmos uma vida que seja ao transformarmos nossa conduta. Estamos tentando fazer a nossa parte e eu quero encorajar cada um de vocês a considerar o que vocês podem fazer também como a parte de vocês.

Em Pessach, nos lembramos da transformação dos filhos de Israel no povo hebreu, um processo baseado na solidariedade e na construção de um caminho conjunto. Que as cenas terríveis que assistimos em Manaus e em outras partes do país nos sensibilizem para a necessidade de mudanças urgentes e verdadeiras.

Shabat Shalom 



terça-feira, 16 de março de 2021

Podcast 5.8 - Episódio 14: Com o olhar para o futuro: o impacto de Israel sobre a identidade judaica na Diáspora

(originalmente publicado em http://5ponto8.fireside.fm/14)

Apesar de nos orgulharmos dos 3500 anos da história judaica, é inegável que alguns eventos dos últimos cem anos têm um peso desproporcional na forma como vivemos judaicamente hoje em dia. A criação do Estado de Israel é um destes eventos com impacto sobre a identidade judaica de virtualmente todos os judeus. Há judeus que concordam mais com as políticas do Estado, outros que concordam menos; há aqueles que o enxergam como o centro de sua vida judaica, outros que nele encontram sua antítese. Antes um fator de união da comunidade judaica, Israel manteve este papel ao longo das suas sete décadas, mas passou a ser também um motivo de discórdia. Por isso, queremos escutar vozes diversas sobre a forma como o Estado de Israel impacta a identidade judaica, nossa resiliência, nosso orgulho, nossa segurança. Hoje, damos o primeiro passo dessa investigação.

Nosso convidado deste episódio é o Samuel Feldberg, doutor em Ciência Política pela USP e um especialista em questões relacionadas a Israel.

Dicas Culturais:

Com Rogério Cukierman e Laura Trachtenberg Hauser.
Créditos da Música de Abertura: Lechá Dodi, da liturgia tradicional de Shabat | Melodia: Craig Taubman | Clarinete: Alexandre F. Travassos | Piano: Tânia F. Travassos.
Edição: Misa Obara

quinta-feira, 11 de março de 2021

A hora de cuidar da comunidade

Na última semana foram inúmeras as mensagens nos grupos de pais da escola do meu filho: manifestos pedindo o fechamento da escola tendo em vista a piora do quadro de saúde pública, manifestos pedindo que a escola continue aberta tendo em vista os impactos positivos para os alunos, matérias de jornais, vídeos de pediatras e de outros especialistas, debates acalorados. Não aconteceu em nenhum dos grupos dos quais faço parte, mas escutei relatos de que os debates algumas vezes descambaram para ofensas pessoais. Ao mesmo tempo, no entanto, vi gente manifestando arrependimento de ter se colocado tão incisivamente a favor desta ou daquela posição, temendo que a guerra de manifestos destruísse a comunidade escolar.

Com o passar da semana, fui me dando conta de que a grande maioria das pessoas, independentemente da sua posição com relação ao fechamento da escola, estava tentando proteger a comunidade. Alguns pensavam na comunidade de crianças pequenas, tão carentes do contato com seus colegas e que, por estarem vivendo em isolamento de outras crianças da mesma idade, ainda não tinham desenvolvido competências sócio-emocionais importantes. Outros pensavam na comunidade de alunos, familiares, funcionários e professores que usam o transporte público, que se arriscariam ao contágio em ambientes saturados se tivessem que vir à escola. Havia quem pensasse na comunidade da cidade como um todo, querendo proteger aqueles que precisam trabalhar mesmo sob as mais rígidas condições de quarentena: médicos, enfermeiros, farmacêuticos, funcionários da limpeza pública e dos transportes coletivos. A forma como definíamos nossa comunidade, ou pelo menos a comunidade pela qual nos sentimos responsáveis, tinha um impacto imenso em qual política considerávamos correta.

A parashá desta semana, Vaiakhêl-Pecudei, começa com Moshé reunindo toda a comunidade e lhes instruindo sobre a hora de parar para o Shabat e lhes pedindo para doar, cada um de acordo com a generosidade do seu coração, para o projeto comum, a construção do Mishcán. Assim como na época de Moshé, temos um projeto conjunto de comunidade, no qual investimos o que temos de mais sagrado: nossa saúde, nosso bem-estar em todos os seus aspectos.

Em 2020, lemos Vaiakhêl-Pecudei no mesmo final de semana em que tivemos o primeiro Cabalat Shabat a portas fechadas na CIP. Ainda inexperientes com a tecnologia e em conduzir um serviço religioso com a sinagoga vazia, começamos a experimentar novos passos. Quem assistir a transmissão do serviço de hoje e compará-la com o que fizemos há um ano, rirá da falta de técnica, óbvia naquelas primeiras transmissões. Aprendemos muito neste ano, passamos a valorizar coisas que considerávamos óbvias, revisitamos conceitos e valores, mas algumas coisas continuaram as mesmas como eram doze meses atrás.

Vários comentaristas notaram que na parashá desta semana alguns aspectos do projeto de construção do Mishcán são repetidos várias vezes. Uma das opiniões é que a repetição serve para indicar que líderes precisam tratar o bem comum com muito cuidado e prestar contas das suas ações à frente da comunidade. Neste momento, com a piora dos índices de saúde pública, é função de cada um de nós exercer sua liderança e garantir que o projeto comum da nossas comunidade, garantir a saúde de todos, seja desempenhado com responsabilidade, cuidado e transparência. Cabe a cada um de nós se cuidar e, assim, ajudar a cuidar da comunidade que todos tanto valorizamos.

Shabat Shalom


terça-feira, 2 de março de 2021

Podcast 5.8 - Episódio 13: Com o olhar para o futuro: o judaísmo ibérico e holandês no Nordeste do Brasil

(Oiginalmente publicado em http://5ponto8.fireside.fm/13)

"Quem segue a pé de Chinatown em direção ao Distrito Financeiro de Nova York talvez passe inadvertido, à altura do número 55 da St. James Place, diante dos 22 metros de comprimento de uma mureta feita de pedras superpostas, encimada por grades pontiagudas e enferrujadas. Por trás dela, nada de excepcional parece chamar a atenção no pequeno descampado estabelecido metro e meio acima do plano da calçada, o solo coberto de musgo e ervas daninhas. À primeira vista, aparenta ser apenas um terreno baldio, simples vazio urbano dando para os fundos deteriorados de prédios populares de três e cinco andares.

Assim de passagem, só mesmo uma dose singular de atenção e curiosidade irá discernir a placa retangular ao rés do chão interno, as letras em alto-relevo recobertas de pátina própria ao tempo: Primeiro Cemitério da Sinagoga Espanhola e Portuguesa Shearith Israel da Cidade de Nova York 1656-1833”

Nossos convidado de hoje é Lira Neto, escritor e jornalista, recebeu o Prêmio Jabuti de Literatura em quatro ocasiões (2007, 2010, 2013 e 2014) e uma vez o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte - APCA (2014). Graduado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Ceará (UFC), é mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Doutorando em História pela Universidade Nova de Lisboa. Lira Neto está publicando nestes dias o livro “Arrancados da Terra” pela Companhia das Letras, no qual ele trata dos processos que levaram a comunidade judaica portuguesa a se refugiar na Holanda e, de lá, fazer parte da invasão holandesa no nordeste brasileiro.

Dicas Culturais:

Com Rogério Cukierman e Laura Trachtenberg Hauser.
Créditos da Música de Abertura: Lechá Dodi, da liturgia tradicional de Shabat | Melodia: Craig Taubman | Clarinete: Alexandre F. Travassos | Piano: Tânia F. Travassos.
Edição: Misa Obara