Qualquer um que não fizesse parte do establishment do Templo em Jerusalém compreendia que os sacrifícios equivaliam a um imposto com comissões para os que faziam parte do esquema, os sacerdotes e os burocratas do santuário, que freqüentemente tinham muito pouco a ver com santidade. A crítica profética e a crítica posterior dos sábios, surgiram contra a tendência de fazer do sacrifício um fim em si mesmo, a uma tecnologia de fé que vem no lugar de um genuíno sentimento religioso de obrigação espiritual e ética. [1]
sexta-feira, 18 de março de 2022
Dvar Torá: Sacrifícios e sacerdotes continuam relevantes? (CIP)
quinta-feira, 10 de março de 2022
O pequeno alef e os sacrifícios a que somos chamados
“Chamou a Moshé e Adonai lhe falou da Tenda do Encontro, dizendo…”. Com este verso começa a parashá desta semana e o livro de Vaicrá, Levítico, o terceiro dos cinco livros da Torá. Quem chamou a Moshé não fica claro e tem sido o objeto de grande debate e especulação entre os comentaristas ao longo dos séculos.
Como componente adicional do mistério, a última letra da primeira palavra deste verso é um alef, que neste caso é escrito em um tamanho menor que as demais letras da página. Quem poderia ter chamado a Moshé para que Deus o instruísse nas regras dos sacrifícios, tema de grande parte deste terceiro livro?
Há comentaristas para quem o alef em tamanho pequeno é sinal de que é o “eu” (“aní”, em hebraico) de Moshé quem o chama e interpretam que cada um deve escutar a sua voz mais profunda, a sua consciência mais verdadeira, para definir quais são nossos interesses que nos levariam a um envolvimento verdadeiro e que sacrifícios estamos dispostos a fazer, de que estamos dispostos a abrir mão.
Uma outra interpretação para o pequeno alef vai na direção contrária e o associa à Shechiná, ao aspecto do Divino que está mais próximo do mundo em que vivemos e presente em todas as coisas e em todas as pessoas. Nesta leitura, escutar o chamado do pequeno alef é prestar atenção ao mundo que nos rodeia para decidir os sacrifícios que precisamos fazer. Se na primeira interpretação, perguntávamos ao nosso eu mais profundo em que deveríamos nos envolver, desta vez, paramos para escutar o que o mundo grita que suas necessidades mais prementes são. Olhamos ao redor, enxergamos o Divino na face das pessoas que nos são próximas e também nas de quem nos é mais distante. Quais são as causas e projetos cuja urgência clama pelo nosso envolvimento, mesmo que não seja o assunto que mais nos interessa?
Em qualquer destas duas abordagens, a questão do sacrifício pessoal tem valor central. Vivemos em um tempo de fartura material como, provavelmente, a humanidade jamais tenha visto. Temos, em geral, muito mais “coisas” do que conseguiríamos aproveitar nas nossas vidas, geramos uma quantidade imensa de lixo a cada dia, e, mesmo assim, temos enorme dificuldade em desapegar, em abrir mão de coisas que nos são caras. Quando fazemos uma doação, é é dinheiro que não nos faltará ou um sapato que já não usamos mais; quando damos algo nosso de presente, é, via de regra, algo do qual enjoamos.
Várias situações anedóticas, no entanto, relatam que pessoas que têm muito menos apresentam maior propensão a dividir o pouco que têm, mesmo que depois lhes falte, mesmo que o feijão fique aguado como consequência do convidado adicional à mesa. O Livro de Vaicrá aponta para este comportamento como desejável: Deus nos instrui a abrir mão das melhores frutas, dos melhores animais, de doarmos aquilo do qual, na verdade, sentiremos falta. E, então, o pequeno alef ao final da primeira palavra do livro nos convida a perguntarmos de que nossa verdade mais íntima nos instrui a abrirmos mão? Em quais causas acreditamos mais profundamente e com a qual queremos contribuir, que realidades gostaríamos de transformar, em que projetos sentimos que precisamos estar envolvidos, mesmo que tenhamos que abrir mão de outros interesses?
Um midrash famoso fala que Avraham chegou à percepção da existência de um Deus único ao perceber que, assim como um farol não se consumia pelo fogo porque havia um faroleiro que cuidava dele, que se o mundo não era consumido pelo caos, o Divino precisava existir para garantir a continuidade do mundo. Vários teólogos dizem que vivemos em uma época de Hester Panim, na qual Deus esconde Sua face. É nossa vez de escutarmos nossa voz interna e de enxergarmos a realidade externa e de fazermos os sacrifícios que conseguirmos para garantir que o caos não engula completamente o nosso mundo.
Qual é a causa que verdadeiramente te interessa? Qual a necessidade sobre a qual você enxerga o mundo gritando e pedindo ajuda? O que você está disposto a sacrificar para garantir que vivamos todos em uma realidade mais justa, mais equilibrada, mais inclusiva e mais acolhedora?
Shabat Shalom!
quinta-feira, 3 de março de 2022
O que vem depois da saída de Mitsrayim?
Duas conversas que eu tive esta semana apontaram em direções opostas. Em uma delas, a pessoa me disse: “o que é, é; o que não é, não é”, com uma convicção evidente de quem acredita na clara distinção entre as categorias das quais falava. Na outra conversa, a pessoa mencionou a Caixa de Schrödinger, o experimento teórico da Física Quântica na qual um gato é mantido em uma caixa de metal fechada, com um dispositivo atômico e um vidro de veneno. Passada uma hora, sem sabermos se o dispositivo atômico havia sido ativado, o experimento considera que o gato está paradoxal e simultaneamente vivo e morto. A menção a este conceito abstrato foi para exemplificar que, às vezes, as categorias se misturam e as coisas estão em várias delas ao mesmo tempo.
Fiquei pensando nisso ao ler a passagem da Torá deste shabat. Nela, alguns conceitos centrais do comprometimento judaico com a Justiça Social, que já tinham sido mencionados em outras partes da Torá, são relembrados. Um trecho se destaca: “Não haverá necessitados em teu meio – pois Adonai te abençoará na terra que Adonai, teu Deus, te dá como posse hereditária na condição de que você escute a voz de Adonai, teu Deus, mantendo e cumprindo toda esta mitsvá que Eu te ordeno hoje. (...) Se, no entanto, houver uma pessoa necessitada em teu meio, um de teus parentes em qualquer um dos teus assentamentos na terra que Adonai, teu Deus, te dá, não endureça teu coração nem feche a tua mão para o teu necessitado.” [1]
Assim, Deus deixa claro que a garantia do bem estar do povo de Israel depende de que nós mesmos sigamos os valores judaicos de ajuda ao próximo. A tradição judaica já nos dá as ferramentas para garantir uma situação de bem estar social, sem a necessidade de milagres ou de intervenção Divina direta. De alguma forma, o sistema que estabelece estes valores e regras já é a intervenção Divina. E, considerando a forma integrada como a comunidade judaica vive em muitas partes (incluindo o Brasil), nosso comprometimento não deve ser apenas com outros judeus, mas com todos aqueles com quem compartilhamos esta terra, em suas maravilhas e em seus desafios.
Mas por que esta é a passagem escolhida pela tradição para ser lida em Pessach? Haverá, certamente, quem argumente que é pela menção ao sacrifício de Pessach, à contagem do Omer e à comemoração das três Festas de Peregrinação (Pessach, Shavuot e Sucot) no final da passagem [2] e eles estão, provavelmente, certos. Eu gostaria de propor um motivo adicional para que esta seja a leitura neste momento do ano. A saída de Mistrayim e a conquista da liberdade pelos hebreus são a narrativa fundacional mais importante da tradição judaica, cara em particular aos conceitos relacionados ao nosso compromisso com a Justiça Social. Em inúmeras passagens da Torá, a proteção aos vulneráveis é explicitamente vinculada ao conceito de que “vocês foram estrangeiros na terra de Mitrayim.” No seder de Pessach revivemos a dor da opressão e a alegria da redenção – por isso, renovamos nosso compromisso com a criação de um mundo no qual possamos viver todos em liberdade e com dignidade. O texto da Torá desta semana reafirma que este compromisso não pode existir apenas de forma abstrata - ele tem implicações concretas sobre nossa conduta, determinando ações que devemos ter e outras nas quais não podemos nos engajar.
Da mesma forma que o Shabat nos permite viver um “gostinho do mundo vindouro” e renova nosso compromisso com construir esta realidade já a partir da Havdalá, Pessach deve renovar nosso comprometimento com um mundo mais justo, onde Liberdade não seja privilégio de alguns, mas possa ser a realidade de todos. Esse é o lembrete que a leitura da Torá deste 8º dia de Pessach nos deixa.
Shabat Shalom,
[1] Deut. 15:4-5,7.
[2] Deut. 16:1-17.
[3] Veja, por exemplo, Ex. 22:20, Lev. 19:34, Deut. 10:19.
quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022
Atenção: Comunidade em Construção
Confesso que nunca gostei muito de praticar esportes, tampouco de assisti-los pela TV. Hoje em dia, quando meu filho passa horas assistindo outras pessoas jogando seus videogames favoritos, eu lhe pergunto se jogar não é mais divertido que assistir, parece que ele não entende a pergunta, como se não existisse, de fato, diferença para ele. o único período em que eu acompanhei esportes pela TV foi na década de 80, quando o Brasil tinha grandes pilotos de corrida. Naquela época, seguíamos duas competições: a Fórmula-1, que era transmitida pela Globo, e a Fórmula Indy, que passava na Bandeirantes. Esta última mesclava circuitos tradicionais, com curvas para os dois lados com circuitos ovais, em geral com curvas apenas para a esquerda, como a famosa 500 Milhas de Indianápolis. Nos dois tipos de circuito, muitas aconteciam a cada volta mas, a menos que um carro se acidentasse ou desistisse no meio, todos retornavam ao mesmo ponto e iniciavam uma nova volta.
Fiquei pensando nas repetições, volta após volta, das corridas de carro ao considerar o que temos vivido nos últimos anos com a pandemia e como a parashá desta semana tem se relacionado com os ciclos (ou as voltas) que temos vivido. Foi nesta parashá, Vaiakhel, que tivemos em 2020 o primeiro Cabalat Shabat a portas fechadas, com medo do que estava por vir. Quando lemos esta parashá em março de 2021, estávamos no começo da segunda onda, assustados (com razão) com a piora do quadro de saúde pública. Neste ano, depois de termos atravessado mais uma piora na saúde pública, estamos com a impressão de que deixamos para trás o pior da crise trazida pela variante Ômicron, começamos a nos preparar para o retorno a atividades presenciais na CIP, tanto para a equipe profissional quanto para nossa comunidade.
A palavra “Vaiakhel”, o nome da parashá, vem da mesma raíz que “kehilá”, “comunidade” ou “congregação”, e se refere ao momento em que Moshé “congrega” todo o povo para transmitir as instruções de Deus com relação à construção do Mishcán. Ao longo dos últimos dois anos, fomos desafiados a repensar o que significa estar em comunidade. Não são raras as situações em que, ao encontrar alguém pela primeira vez, me dizem “eu já te conheço, mas você ainda não sabe quem eu sou.” Frente à minha cara de espanto (pelo menos nas primeiras vezes que me disseram isso), a pessoa continua: “acompanho os serviços da CIP online, então já acostumei a rezar com você na sala da minha casa, só você que não consegue ver que estamos lá, juntos.” Quem já participou destes serviços religiosos online sabe que há uma comunidade que “se encontra” no mundo virtual, manda saudações de Shabat Shalom, reage uns aos comentários dos outros. Será que é esse o novo formato de comunidade com o qual precisamos nos acostumar, em que não nos vemos mas reconhecemos que estamos participando da mesma experiência?
Uma outra vivência online é o minián diário da CIP. Nos encontramos por Zoom, o que permite que sejamos vistos e também vejamos os participantes. Pessoas de todo o país, que antes não tinham a oportunidade de rezar juntas, passaram a se encontrar diariamente. Ao longo dos últimos dois anos, tivemos vários casos de famílias enlutadas que, graças à tecnologia, puderam congregar membros que viviam em continentes distintos. Antes do serviço e ao seu final, conversam um pouco, conhecem mais da vida de cada um. Será esta a nova forma de interatividade das nossas comunidades, em que nos reunimos virtualmente para um propósito, cada no seu canto?
Nossas aulas passaram a ser online também. Aos alunos de São Paulo, passamos a reunir alunos de Brasília, de Manaus, de Recife, até de Portugal. Em pequenas salas virtuais, estes alunos discutiram textos judaicos antigos e o usaram de ponto de partida para falar de suas vidas. Se conheceram e se estabeleceram como grupo (contando também, é claro com o apoio de um grupo de whatsapp) e passaram a se encontrar também fora das telas (quem está na mesma cidade…). Será que na nossa nova comunidade a tecnologia servirá de catalisador para encontros presenciais?
O sentido, o formato, o significado das nossas comunidades nunca foi tão fluido. Ao planejarmos a volta ao mundo presencial, consideramos de que aspectos de vida comunitária sentimos falta e que gostaríamos de recuperar e o que ganhamos com a incorporação de novas estratégias de construção comunitária, que gostaríamos de manter. Na elaboração destes planos, a pergunta básica que fica é qual será a cara da comunidade no século XXI pós-Covid. Há quem fale em metaversos e outras modalidades de interação virtual para argumentar que precisamos nos acostumar a relacionamentos que se estabelecem principalmente através das telas, sem a necessidade de estarmos todos no mesmo espaço. Particularmente, apesar de reconhecer que a tecnologia veio para ficar e não faz sentido pensar em descartá-la, sinto falta do contato interpessoal, da conversa ao redor da mesa de kidush ou do cafezinho, do abraço e do aperto de mão na chegada e na despedida.
Nesta parashá, Moshé transmite ao povo de Israel, reunido em comunidade, o pedido de doações para a construção do Mishcán, o projeto comunitário da época. A resposta de todo o povo é tão intensa que os artesãos lhe pedem para orientar o povo a parar de trazer novos donativos. Qualquer que seja o formato da nova comunidade que estamos construindo, que possamos sempre estar dispostos a entregar um pouco de nós mesmos para este projeto coletivo e que a CIP continue sendo um ponto de encontro de pessoas, de ideias e de valores que mantém o judaísmo relevante para muito mais voltas no circuito da vida.
Shabat Shalom.
sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022
Dvar Torá: Valorizando a incerteza (CIP)
sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022
Dvar Torá: Criando na comunidade o espaço do Divino (CIP)
Um rabino, tocado pela pobreza em sua cidade, resolve dedicar a prédica à necessidade de que a comunidade aumentasse as doações para os mais necessitados. No dia seguinte, seus alunos lhe abordaram, curiosos em saber se a prédica já tinha dado algum efeito. “Consegui um resultado de 50%”, disse o rabino. “quem precisa, já está interessado em receber; resta apenas convencer quem pode a aumentar suas doações.” [1]
Apelos à unidade judaica, ao que parece, eram tão comuns no tempo do Sfat Emet quanto no nosso. Lembrando uma Varsóvia dividida entre chassidim e socialistas, sionistas e assimilacionistas, esse ensinamento era tão necessário no início de 1900, quando foi dito, como é hoje. Mas sua mensagem é mais definida do que isso: o caminho para alcançar a unidade é através de cada um mantendo seu próprio ponto de vista distinto enquanto compartilha com todos os outros em um contexto que aceita plenamente a infinita variedade de mentes e opiniões, todas elas um Todo Divino único. Aqui nenhum ponto de vista deve ser descartado ou rejeitado, pois isso apenas diminuiria o todo, desfigurando o nome de Deus. Tal modelo verdadeiramente pluralista de vida judaica ainda precisa ser testado. [13]
quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022
Inovação e Tradição também nos nossos Símbolos
Imagine que alguém te lance um desafio: você precisa desenhar o logo para uma nova iniciativa, um projeto inovador e enraizado na tradição judaica. Pare alguns minutos para pensar quais seriam os elementos básicos que você usaria para desenhar esta marca.
Sem ver o que você preparou, as chances são grandes que tenha ido por um de dois caminhos: algo baseado em uma estrela de David ou em uma menorá. Se olharmos para as grandes entidades judaicas, estes sãos os caminhos que a maioria delas trilha: só para identificar algumas, a CIP, a Bnai Brith, a Hebraica e as três grandes escolas judaicas da minha adolescência (Peretz, Renascença e Bialik) foram pelo caminho da menorá; já a Fisesp, a Conib, o Hospital Albert Einstein e o Macabi buscaram releituras da estrela de David.
De onde vieram estes dois ícones tão associados à comunidade judaica contemporânea. As primeiras estrelas de David que encontramos associadas ao mundo judaico datam do séc. IV EC, em decorações de sinagogas na região da Galileia, em Israel. Na mesma época, no entanto, o símbolo também aparecia em igrejas cristãs naquela região. Na idade média, tanto místicos judeus quanto muçulmanos adotavam a estrela de seis pontas (que chamavam de “Selo de Salomão”) como talismã em suas práticas. Foi apenas nos últimos séculos que o símbolo, já com o nome de estrela de David, se estabeleceu como referência exclusivamente judaica, tendência que ganhou força quando foi escolhida como símbolo pelo movimento sionista no século XIX.
A menorá, por outro lado, tem origem muito mais antiga: vem da Torá e aparece no texto da parashá desta semana [1]. A instrução bíblica para sua construção remete a diversas referências botânicas: copos em formas de flor de amendoeira, cálices, pétalas e hastes que saem de um tronco central. Ao ler o texto, se não identificarmos imediatamente que o texto está falando de uma menorá, poderíamos imaginar que trata-se da descrição de uma árvore. De fato, vários estudiosos apontam que o desenho da menorá, com suas hastes saindo de um eixo central e com bulbos sob cada cada haste, é, de fato, baseado em um arbusto presente no Oriente Médio [2], um tipo de sálvia silvestre.
Há quem veja a origem para a menorá em árvores presentes na mitologia judaica (como a árvore do conhecimento do bem e do mal, na história do Jardim do Eden). No total, há 535 referências a árvores ou a madeira no Tanach, um montante que excede qualquer outro ser vivo, exceto pelos seres humanos.
Outros acadêmicos apontam para o fato de que a cultura e religião israelitas substituíram práticas religiosas canaanitas, nas quais árvores eram, muitas vezes, objeto de adoração. Uma dessas árvores em particular, a Asherá, era considerada a mãe de todas as outras divindades e encontramos na Torá e na literatura rabínica forte polêmicas com relação a ela [4]. Para quem aponta na Asherá (ou em outras árvores que serviam de objeto de adoração pagã) a origem da Menorá, a Torá teria feito o que a tradição judaica fez tantas vezes: incorporou elementos de outras culturas, judaizando-as, ou seja: mantendo alguns elementos, mas removendo os aspectos que estavam em contradição com os valores judaicos. Da mesma forma. a estrela de David não nasceu necessariamente judaica mas se tornou um símbolo “nosso” pelos usos que lhe atribuímos. Quem imagina que as comunidades judaicas ao longo da história viveram isoladas das sociedades mais amplas, sem contato com suas culturas, pode ficar chocado com este tipo de argumentação, mas ele aponta para o caminho que, também olhando para o futuro, possibilita a contínua criatividade judaica em diálogo com outros segmentos sociais e culturais.
A verdade é que minha pesquisa de logos judaicos mais recentes revelou novas tendências que, nem sempre, se baseiam só na Menorá ou na Estrela de David. Entidades judaicas mais recentes têm se permitido maior criatividade em sua linguagem visual (veja, por exemplo, os logos da Moishe House, dos Jovens Sem Fronteiras, do Cursinho Romã ou da Academia Judaica) – um sinal de seu desejo de poder definir em seus próprios termos quais aspectos de identidade judaica desejam incorporar em sua atuação. Mais seguros em nossas identidades e integração social, temos nos permitido também maior arrojo gráfico e visual.
Que neste Shabat possamos encontrar novas formas de sermos inovadores e de termos a tradição presentes em nossas vidas,
Shabat Shalom!
[1] Ex. 25:31-40
[4] Veja, por exemplo, Deut. 16:21 e Talmud Bavli Avodá Zará 48a